Livro / eBook – Todas as minhas libélulas escrito por Gabrielli Casseta
Ler Todas as minhas libélulas, da escritora Gabrielli Casseta, foi uma experiência que me pegou de surpresa — daquelas leituras que nos marcam não apenas pela trama, mas pela sensibilidade e profundidade com que seus elementos são entrelaçados. Como escritor e leitor apaixonado por literatura fantástica, preciso dizer: este livro me mostrou que ainda é possível contar histórias épicas com lirismo e emoção genuína.
Ambientado em um mundo assolado pela guerra e povoado por criaturas fantásticas, o romance nos apresenta a jovem Joana, incumbida de proteger o El Berith — o livro sagrado — enquanto lida com memórias traumáticas e a chegada de um novo amor à sua vila. Paralelamente, temos Celina, uma historiadora que retorna à cidade de Itororó em busca de uma misteriosa caixa cheia de libélulas douradas — fragmentos essenciais para reconstruir a história do seu povo.
Essa fusão de fantasia épica, memórias familiares e exploração identitária é o que torna Todas as minhas libélulas uma leitura tão instigante. O livro mescla dois tempos narrativos com fluidez impressionante, entre o passado de Joana e o presente de Celina. Casseta constrói um universo que, mesmo com monstros alados e lendas antigas, nunca perde o foco no humano: no afeto, no medo, na escolha entre destino e desejo.
A simbologia das libélulas é um dos grandes trunfos da obra. Elas representam memórias, perdas e a tentativa de reconstruir a história através dos fragmentos deixados para trás. Celina, como historiadora, encarna essa busca pelo sentido perdido, e sua jornada é uma metáfora poderosa para quem já tentou, de alguma forma, curar uma herança de dor com afeto e narrativa.
Outro ponto alto é a construção das personagens femininas. Joana e Celina são protagonistas fortes, mas não no clichê da guerreira invencível. São fortes porque sentem, duvidam, erram — e ainda assim persistem. A linguagem da autora é delicada sem ser rasa, carregada de imagens poéticas que elevam a experiência de leitura. O uso da Língua das Mãos como elemento narrativo, por exemplo, é um detalhe de uma sensibilidade rara, que valoriza a comunicação não verbal e amplia a diversidade do universo criado.
Do ponto de vista técnico, a obra também se destaca. Gabrielli Casseta entrega um worldbuilding coeso, onde o cenário e a mitologia servem à narrativa e não apenas à estética. A guerra, o Milchamah, os seres alados, os kardamas — tudo contribui para construir a atmosfera densa e encantadora do livro. É impossível não se emocionar com as entrelinhas que abordam memória coletiva, trauma intergeracional e resiliência feminina.
Se você busca um livro de fantasia com profundidade emocional, personagens marcantes e uma escrita refinada, Todas as minhas libélulas é leitura obrigatória. É o tipo de obra que prova que a fantasia pode, sim, dialogar com temas contemporâneos como migração, perda e pertencimento — tudo isso com um toque poético que poucas autoras conseguem imprimir.
Gabrielli Casseta é uma voz potente na literatura nacional e merece ser lida, divulgada e discutida. Suas libélulas douradas ainda vão voar muito longe.